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Popularização da ciência no Facebook: análises estatísticas de publicações de uma universidade brasileira
Popularización de la ciencia en Facebook: análisis estadístico de las publicaciones de una universidad brasileña
Science popularization on Facebook: statistical analysis of posts from a Brazilian university
Intercom: Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, vol. 46, e2023108, 2023
Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (INTERCOM)

Artigos


Recepção: 09 Abril 2020

Aprovação: 05 Abril 2023

DOI: https://doi.org/10.1590/1809-58442023108pt

Financiamento

Fonte: Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais

Número do contrato: APQ-04020-15

Descrição completa: Este estudo teve o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (APQ-04020-15).

Resumo: Este estudo analisou estatisticamente a repercussão de um projeto de popularização da ciência (PC), implantado em uma universidade brasileira, durante seus primeiros 14 meses de execução. As métricas utilizadas foram os resultados alcançados pelos posts de 95 vídeos de divulgação de pesquisas científicas na página da instituição no Facebook. O objetivo foi verificar o potencial dialógico do projeto, considerando as possibilidades de participação do público propiciadas pelas mídias sociais. Foram analisados dados descritivos gerais (média, mínimo, máxima e desvio padrão), bem como correlação de Pearson e formação de clusters. Entre os principais resultados, observamos que os vídeos publicados podem ser divididos em cinco clusters, que se diferenciam pelo nível de interação/alcance e sugerem que os temas das pesquisas - assim como estratégias de texto e vídeo utilizados nas postagens - interferem no potencial de interação com o público. Os resultados podem orientar os planejamentos de PC.

Palavras-chave: Popularização da ciência, Facebook, Mobilização pública, Universidade pública, Pesquisa científica.

Resumen: Este artículo presenta los resultados de un estudio estadístico de la repercusión de un proyecto para popularizar la ciencia, de una universidad brasileña, durante sus primeros 14 meses de ejecución. Las métricas utilizadas son los resultados logrados por 95 videos de difusión de la investigación científica en la página de Facebook de la institución. El objetivo fue verificar el potencial de diálogo del proyecto por medio de las posibilidades de participación pública que brindan las redes sociales. Para esta investigación, se analizaron datos descriptivos generales (media, mínimo, máximo y desviación típica), la correlación de Pearson y la formación de grupos. Entre los principales resultados, se observa que los videos publicados pueden ser divididos en cinco grupos, que se difieren según el nivel de interacción / alcance y sugieren que los temas de la investigación – así como estrategias de texto y video utilizadas en las publicaciones – interfieren en el potencial de interacción con la con el público. Los resultados pueden guiar la planificación para popularizar la ciencia.

Palabras clave: Popularización de la ciencia, Facebook, Movilización pública, Universidad pública, Investigación científica.

Abstract: This study performed a statistical analysis of the repercussions of a project concerning science popularization (SP) during the first 14 months of execution in a Brazilian public university. The metrics used were the results achieved from posts of 95 videos disseminating scientific research on the institution’s Facebook page. The objective was to verify the dialogical potential of the project while considering that social media increase the possibilities for public participation. Analyses included general descriptive data (means, minima, maxima, and standard deviations), Pearson’s correlation coefficients, and clusters’ formation. Among the main results, we verified that the published videos can be divided into five clusters, which differ by the level of interaction/reach. The research themes, text, and video strategies used in the posts modulate the potential for interaction with the public. The results are helpful for the future planning of SP actions.

Keywords: Science popularization, Facebook, Public mobilization, Public university, Scientific research.

Introdução

Diversas perspectivas contemporâneas do campo das ciências sociais, com diferentes intensidades e enfoques, enfatizam a importância do engajamento público e priorizam a atuação do cidadão nas decisões políticas. Seja pelo viés da governança (RYAN, 2015; MEJLGAARD et al., 2012; GUSTON, 2014), seja pela proposta de “ação gerencial dialógica” (CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2013), há a ideia bastante presente de que os cidadãos devem participar ativamente do debate público. Nesse contexto, um desafio importante é que a sociedade civil tenha acesso a conhecimentos técnicos e científicos que ampliem seu potencial de argumentação nas discussões. O fluxo de informações sobre Ciência e Tecnologia (C&T) torna-se, assim, essencial para a esfera pública, pois elas afetam diretamente a sociedade: estão relacionadas a políticas de saúde, educação, segurança pública, inclusão social, desenvolvimento econômico, sustentabilidade etc. (OLIVEIRA, 2010). O resultado dos esforços em C&T também permeia a vida cotidiana do cidadão de forma direta e concreta – influenciando, por exemplo, a escolha de produtos no momento do consumo.

As universidades, como instâncias geradoras de produção científica, têm seu papel nesse processo aqui chamado de Popularização da Ciência (PC). Mantidas com investimentos públicos, as universidades federais brasileiras têm compromissos com a sociedade quanto ao ensino de qualidade, ao desenvolvimento de pesquisas em diferentes áreas do conhecimento e ao diálogo de saberes entre universidade e sociedade. A popularização da ciência praticada nas assessorias de comunicação dessas instituições, ao buscar a linguagem de entendimento geral para compartilhar o conhecimento científico e tecnológico, pode oferecer contribuição relevante para a circulação de informações sobre ciência e tecnologia na sociedade.

Assumindo a importância da popularização da ciência, desenvolvemos um estudo de caso sobre a primeira etapa de execução do projeto “Criação do Núcleo de Divulgação Científica da Universidade Federal de Lavras (UFLA): atravessando a torre de marfim”. O projeto foi submetido pela área de comunicação organizacional da Universidade à Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig), mediante edital divulgado em 2015 com o objetivo de apoiar a formação de estruturas para comunicação da ciência nas instituições federais de ensino superior do estado brasileiro de Minas Gerais. Na UFLA, esse projeto foi o primeiro esforço coordenado para a divulgação sistemática de conteúdo de popularização da ciência por meio da comunicação organizacional.

O projeto começou com uma produção periódica em novembro de 2017 e pesquisas foram divulgadas duas vezes por semana na página oficial da instituição na Internet, bem como em mídias sociais e em revista de jornalismo científico criada para este fim. Para o presente estudo de caso, adotamos como amostra as publicações de vídeos na página do Facebook feitas entre novembro de 2017 e dezembro de 2018, incluindo todos os vídeos da editoria principal do projeto (95 publicações compuseram o banco de dados). O software SPSS foi utilizado para processamento das informações, extraídas das métricas disponibilizadas pelo Facebook aos organizadores da página.

O objetivo do artigo é, portanto, analisar estatisticamente o envolvimento gerado com diferentes publicações sobre ciência em uma rede social que possibilita a interação. Intenciona-se, com os resultados, uma reflexão sobre o potencial dialógico do projeto e seus resultados efetivos de envolvimento da sociedade com a informação científica.

Quando falamos em popularização da ciência, estamos nos referindo à transposição de ideias dos textos científicos para as comunicações populares (MUELLER, 2002), à tarefa de tornar o conhecimento científico compreensível e acessível ao público leigo para interação (SCHARRER et al., 2017). Ao propor o ciclo da informação científica, Lievrouw (1992) define o estágio da popularização como aquele em que as atividades de comunicação começam a romper as fronteiras do campo científico e se espalhar pela sociedade através dos meios de comunicação de massa e outros veículos.

Há uma extensa discussão na literatura sobre os modelos ou perspectivas adotadas ao longo do tempo para a divulgação pública da ciência, desde aqueles que consideram o público como passivo, ignorante, mero receptor de informações, até aqueles que pregam o dialogismo e a consideração dos saberes populares e seus valores no processo de PC (KATO-NITTA et al., 2018; MYERS, 2003; BAEUR, 2007; GREGORY et al., 2002; STILGOE et al., 2014; MAKAROVS; ACHTERBERG, 2018; JASANOFF, 2014; NISBET; SCHEUFELE, 2009; BURNS; O’CONNOR; STOCKLMAYER, 2003; FRIESIKE et al., 2016; DIETZ, 2013).

Com a transição do modelo do déficit (público passivo) para o modelo do diálogo, passa-se ao plano da cidadania democrática e do pluralismo igualitário. A racionalidade científica abre espaço para outros tipos de razão. E a maneira de gerenciar isso é o diálogo, em que os atores são parceiros na comunicação, requerendo-se uma alteração das hierarquias tradicionais do conhecimento. Pieczka e Escobar (2012) encontraram tentativas genuínas de empreendimento de diálogos deliberativos, mas também identificaram indícios de que o diálogo tem sido usado como uma ferramenta sofisticada para gerenciar as percepções do público. Concluem que a comunidade científica trabalha ancorada na mentalidade limitada da compreensão pública, embora utilize recursos retóricos de diálogo.

Um enfoque teórico importante, muito relacionado aos modelos do engajamento e do diálogo, é o da participação cidadã na ciência como forma de garantir legitimidade aos processos de formulação de políticas públicas e compensar os déficits democráticos (RYAN, 2015). Os modos de dar voz ao cidadão podem variar, mas a concepção é de que as decisões políticas são mais eficazes quando há participação. A noção de participação cidadã está vinculada à ideia de governança, termo saliente nos estudos, que se refere à participação de um conjunto de atores, inclusive da sociedade civil, nas decisões públicas, que passam a ser coletivas. A autora diz que as questões de governança científica têm o potencial de desafiar modelos de democracia prevalentes e passivos, sugerindo novas possibilidades de revitalização democrática.

As perspectivas dialógicas conversam bem com as proposições de Santos (1988) sobre a segunda ruptura epistemológica da ciência, em que se estabeleceria um diálogo entre a ciência e o senso comum produzindo-se um conhecimento prático esclarecido, ou mesmo com sua proposta de uma “ecologia de saberes”, em que o saber científico seria considerado um entre vários. Conversam também com ação comunicativa de Habermas (2012). Podemos inferir que esse processo de o conhecimento científico se constituir em um novo senso comum não pode se dar sem as práticas de PC e, portanto, sem o amparo das reflexões das ciências humanas e sociais.

Considerando a perspectiva dialógica como a tendência contemporânea para se pensar a PC, este artigo estuda as ações de popularização praticadas no Facebook, uma das mídias sociais em utilização na contemporaneidade, que, como as demais, possibilita a interação e o diálogo. Hargittai, Füchslin e Schäfer (2018) afirmam que, apesar de muitas pesquisas terem como objeto as mídias sociais digitais, há uma lacuna de estudos quando a temática é o potencial específico para o compartilhamento de conteúdos relacionados à ciência. Os autores defendem que o foco no engajamento com a ciência e o conteúdo de pesquisa nas mídias sociais devem integrar as preocupações de quem estuda a comunicação científica. Mídias sociais têm o diferencial de permitir o engajamento direto das pessoas em várias conversas. Elas também transformam as possibilidades para cientistas e instituições de pesquisa, que passam a ter canais diretos de comunicação com o público.

Citando um estudo da National Sciece Board de 2018, Hargittai, Füchslin e Schäfer (2018) mencionaram que 81% dos jovens com idade entre 18 e 24 anos usavam a Internet como sua principal fonte de informação científica e tecnológica. As mídias sociais figuraram também como a primeira fonte de informações sobre o tema para esse público (83%). Em pesquisa com jovens suíços, os autores apuraram que 95,6% procuravam informações sobre ciência na Internet, sendo que 62,9% faziam isso semanalmente. O tópico só perde para a procura de informações sobre eventos atuais, que mobiliza 99,5%. Na amostra de jovens adultos, 81,3% disseram que já clicaram ou comentaram informações sobre ciência, percentual parecido com a interação com temas sobre eventos atuais, embora esses últimos provoquem um envolvimento mais contínuo (semanal). Os dados apontaram também que os jovens adultos utilizavam menos o Twitter do que o Facebook para interagir com os conteúdos de ciência, o que levou os autores a considerarem, naquele momento do estudo, o Facebook mais relevante para estudar as interações entre ciência e sociedade.

Além disso, o Facebook foi uma das principais mídias sociais utilizadas na implementação do projeto de PC da UFLA e, na ocasião da coleta de dados (entre 2017 e 2018), apesar de já estar apresentando declínio de popularidade, especialmente com o público jovem, era considerada a maior rede social do mundo em usuários ativos mensais. A tendência de queda no número de brasileiros com conta no Facebook foi apontada pela pesquisa Datafolha em 2019, mas, ainda assim, mantinha-se com 56% dos entrevistados informando ter conta nessa rede social. Eram 127 milhões de usuários ativos mensais (NEGRÃO, 2019).

Lee e VanDyke (2015) argumentam que o diálogo propiciado pelas mídias sociais pode colaborar para a reputação das instituições de pesquisa, bem como dar a elas a oportunidade de identificar discordâncias ou mal-entendidos quanto a seus conteúdos. Entretanto, seu estudo realizado com 252 posts de organizações governamentais americanas ligadas à ciência corrobora pesquisas que mostram que as agências governamentais não utilizam o potencial dialógico das mídias sociais, enfatizando a disseminação unidirecional de conteúdo científico. Os autores identificaram que as postagens raramente fazem perguntas aos usuários ou pedem opinião. Outra estratégia não utilizada é a de encorajar comportamentos off-line, dizendo como o usuário pode utilizar a informação disponível no post. O índice de resposta aos comentários pelas organizações também é muito baixo.

Procedimentos e métodos

Adotamos como amostra as 95 publicações de vídeos sobre pesquisas e conteúdos científicos feitas na página oficial da UFLA no Facebook entre novembro de 2017 e dezembro de 2018, correspondentes à primeira editoria criada no projeto em análise, intitulado “Minuto do Campus”. As práticas institucionais de PC da Instituição foram selecionadas para esta análise considerando-se que a Universidade estava em processo de implantação do projeto “Criação do Núcleo de Divulgação Científica: atravessando a torre de marfim”, aprovado em um edital lançado pela Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig) e motivado, especificamente, pelo objetivo de incentivar as instituições mineiras a estruturarem suas áreas de comunicação, de forma a poderem se dedicar à PC. Apesar de estar em funcionamento há mais de um século, tendo sido fundada em 1908 como Escola Agrícola de Lavras, e possuir reconhecimento em rankings e avaliações nacionais e internacionais pela qualidade do ensino e da pesquisa praticados, suas divulgações institucionais no âmbito da popularização da ciência eram esparsas até a implementação do projeto (SILVA; PEREIRA, 2021).

Classificamos cada publicação analisada segundo as áreas de conhecimento organizadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no Brasil (Tabela 3). Para a categorização, consideramos o departamento da Universidade em que foi produzida a pesquisa. Como há muitas pesquisas interdisciplinares, é comum, por exemplo, o Departamento de Administração ter pesquisas que envolvam o negócio “café”, relacionando as áreas de Ciências Sociais e Agrárias. Optamos, no entanto, por definir a classificação respeitando o enquadramento da área acadêmica de origem do estudo.

Em seguida (Quadro 1), levantamos as métricas atribuídas a cada postagem segundo registros do próprio Facebook, disponíveis para os administradores da página. Foram considerados os seguintes indicadores, todos em escala razão:

Quadro 1
Variáveis métricas (razão) incluídas na análise

Fonte: Painel profissional do perfil da UFLA no Facebook.

O banco de dados com esses indicadores foi, então, organizado utilizando-se o software SPSS Statistics (versão 17.0). Nas análises estatísticas, optou-se por utilizar: dados descritivos gerais (média, mínimo, máximo de desvio padrão), frequência de áreas de conhecimento, análise de correlação de Pearson, análise de clusters pelo Ward’s Method/Squared Euclidean Distance e apuração das frequências dos clusters.

Resultados e análises

Os resultados foram úteis para revelar pormenores capazes de auxiliar no planejamento da popularização da ciência (PC) nas mídias sociais por meio da comunicação organizacional.

Dados descritivos gerais

Observa-se grande amplitude em variáveis como alcance das publicações, número de visualizações do vídeo, reações positivas, compartilhamentos e marcações. As variáveis indicam engajamento e, portanto, a ampla variação mostra que o público recebe e reage de forma diferente a pautas distintas e conteúdos de ciência. Nos comentários – subdivididos em marcações, críticas, elogios e perguntas –, a média só é mais expressiva nas marcações e nos elogios. O público pergunta e critica relativamente pouco, independentemente da pauta. Apenas em uma das publicações, que será abordada na análise de clusters, o número de críticas chegou a 32, sendo que a média para essa variável é de 0,51.

No que se refere às variáveis ligadas ao perfil demográfico, vemos que a participação por gênero (homens e mulheres, segundo perfil disponível nas estatísticas da plataforma) no conteúdo de ciência é geralmente equilibrada no conjunto das postagens. Entretanto, na postagem que trata de aleitamento materno, a participação feminina chegou a 80%. Já no conteúdo sobre a construção de um filtro agroecológico, o pico foi do público masculino – 70%. São dados que mostram que alguns temas na ciência têm potencial de mobilização diferente de acordo com o gênero.

Quanto à idade, há uma baixa presença de jovens entre 13 e 17 anos. Trata-se de um público que estaria predominantemente no ensino médio e poderia estar mais engajado na página da Universidade. Os públicos de 18 a 24 anos, que abrangem a faixa etária mais expressiva entre os estudantes de graduação da UFLA, têm uma participação média de 30%, embora cheguem a mais de 50% em algumas postagens e ausentem-se bastante em outras (9,2% para 18-24 anos no registro mínimo). Esse último caso ocorreu com o vídeo que busca responder se chá de hibisco emagrece. A segunda menor participação desse público (11,6%) foi com o vídeo sobre a diferença entre ovos caipiras e industriais - justamente a matéria recordista de engajamento e alcance (outlier). Ao contrário, quando a pauta foi a judicialização de políticas públicas, um tema capaz de mobilizar pessoas de uma área específica, teve-se a participação recorde (54,1%) nessa faixa etária, embora no contexto geral esse tenha sido um tema de desempenho baixo, conforme se verá na análise de clusters. Quando a divulgação foi sobre um novo veículo desenvolvido por uma equipe da UFLA (O carro Caos), esse público teve sua segunda maior participação (51,4%).

Outro público com números parecidos é o da faixa seguinte (25-34 anos), que tem média de 34,43% e registra picos de presença mínima e máxima parecidos com o da faixa anterior. É um público que pode abarcar boa parte dos estudantes de pós-graduação, além de egressos recentes da graduação, sem desconsiderar o público externo à instituição. A publicação que menos os envolveu (16,7%) foi sobre a diferença entre ovos caipiras e de granja; e a que mais os envolveu (51,8%) foi a que trata dos arranjos produtivos locais na indústria do café. Ao que parece, com esses públicos mais jovens, a maior mobilização ocorre com temas ligados à sua área de estudos, já que as duas pesquisas com mais interação, nas duas faixas etárias, são discussões mais específicas de determinadas áreas do conhecimento.

Na faixa etária de 35 a 44 anos, o público é menos presente (média de 16%), menos interessado em temas muito específicos de determinadas áreas e mais interessado em temas de repercussão geral, como os de saúde, alimentação e educação. As três publicações que mais mobilizaram esse público, foram sobre cegos e educação (35%), doenças negligenciadas (30,1%) e a que fala sobre o potencial emagrecedor do chá de hibisco (30%). Já as que menos mobilizaram, foram sobre a utilização da tecnologia de termografia infravermelha (6,6%), novas espécies de tatuzinhos em cavernas (9,4%) e desenvolvimento de um dispositivo holográfico (9,5%).

As faixas etárias seguintes, a partir de 45 anos, já ocorrem em uma média menor – juntas somam 16%. É nelas que a publicação de maior repercussão ganhou um percentual proporcional de público mais significativo. Os temas que envolvem tecnologias são os de menor interesse, acompanhados dos que tratam de política e questões mais sociais. Destacam-se como publicações de maior interesse as que flertam com o dia a dia, alimentação e temas de circulação na mídia.

Quanto à localização geográfica de acesso, o maior público geral é de Minas Gerais (média de 76,09%). Outros estados representam 20,9%, neste caso, a maior predominância é de São Paulo. O acesso dos demais estados, bem como de outros países, é menos expressivo. Quando observamos as pautas de maior e menor repercussão em outros estados, vemos que coincidem com aquelas que marcam as faixas etárias a partir de 45 anos. A correlação de Pearson confirma essa relação, pois mostra que é altamente significativa a relação positiva do público dessa idade com a representação de outros estados, ou seja, o público de outros estados que acompanha as publicações é predominantemente de faixas etárias mais elevadas.

A Tabela 1 resume as estatísticas descritivas. Por ela é possível acompanhar os resultados mínimos e máximos do conjunto de publicações, bem como a média e o desvio padrão, indicando a dispersão dos resultados.

Tabela 1
Principais dados descritivos da amostra

Fonte: Elaboração dos autores, com base no processamento de dados extraído do software SPSS.

De forma geral, esses dados já permitem identificar uma forte diferenciação da participação dos públicos em distintas pautas de ciência. Quanto à frequência das publicações por área do conhecimento (Quadro 2), houve predominância das Ciências Agrárias (33,7%), fato compreensível considerando-se o histórico da Universidade, de tradição nesse campo. Entretanto, outras estatísticas e cruzamentos feitos durante o processo não revelaram diferenciação de mobilização do público em função das áreas do conhecimento. A diferenciação ocorre mais em função dos próprios temas do que das áreas.

Quadro 2
Frequência de publicações por área do conhecimento, conforme CNPq

Fonte: Elaboração dos autores, com base no processamento de dados extraído do software SPSS.

Correlação entre as variáveis

Para apurar estatisticamente as variáveis que se comportam de forma articulada, porém, independente, optamos por verificar a correlação de Pearson por meio do SPSS. Consideramos na análise todas as variáveis métricas do estudo. Do cruzamento de 22 variáveis, mais de 100 resultados foram altamente significativos (a 1%) e 30 foram significativos (a 5%). Devido ao espaço limitado do artigo, comentaremos apenas alguns dos resultados que trazem informações novas e úteis ao planejamento de comunicação para a PC.

Os compartilhamentos são uma variável relevante e representativa da interação, pois quando o público chega a compartilhar é porque atribuiu tanta importância ao conteúdo que deseja que muitas outras pessoas o vejam. Os internautas passam a serem novos emissores daquele conteúdo. Tal ação tem correlação negativa com os públicos de 18 a 24 anos (-,254, significativa a 5%) e de 25 a 34 anos (-,264, significativa a 1%). Já a relação para todos os públicos maiores de 45 anos é altamente significativa (a 1%) e positiva: ,303, para 45 a 54 anos; ,378 para 55 a 64; e ,412 para maiores de 65). Então, mesmo que o público dessas últimas faixas etárias sejam os menos frequentes na página, são os que mais interagem via compartilhamentos. Há também a relação negativa entre o público do estado de Minas Gerais e os compartilhamentos (-,443, significativa a 1%). Essa menor interação dos jovens por compartilhamento é um dado importante ao se analisar as constatações dos estudos de Hargittai, Füchslin e Schäfer (2018) de que o Facebook seria uma mídia promissora para a divulgação da ciência entre os jovens.

Quanto a críticas e perguntas, a participação do público de faixas etárias mais elevadas também é mais representativa. Na faixa de 55 a 64 anos a correlação é altamente significativa (1%) e positiva em críticas (,311) e perguntas (,384). Com os maiores de 65 anos a situação é semelhante (,401 para críticas e ,424 para perguntas, ambos a 1%). Destacamos também os cruzamentos de faixa etária entre os públicos. As correlações entre os públicos indicam uma tendência de comportamento semelhante dos públicos da faixa de 35-44 anos: a correlação é altamente significativa (1%) desse último público com o de 45-55 anos (,434) e de 55-64 anos (,362). Com o público maior de 65 anos, a correlação é significativa (5%) com coeficiente de ,229.

Na faixa etária de 45 a 54 anos, começamos a ver uma relação positiva e altamente significativa (1%) com o acesso a partir de outros estados (,290) e negativa com Minas Gerais (-,367). Resultados semelhantes se repetem nas faixas seguintes, mostrando que o público das faixas etárias mais elevadas está, prioritariamente, fora de Minas Gerais. Como já citamos, segundo os dados do Facebook, o estado mais presente após Minas Gerais é São Paulo. Considerando outras fontes, como o questionário do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) 2017 (PRESS KIT..., 2018), é possível conjecturar quem é esse público: no perfil do estudante da UFLA, após Minas Gerais, a segunda principal origem desse público é São Paulo. Assim, os acessos vindos de outros estados (predominantemente São Paulo), por envolverem uma faixa etária mais avançada, podem ser dos familiares dos estudantes.

Sobre as reações positivas, seus cruzamentos mostram que, quando elas tendem a crescer, as negativas também tendem (,924, com significância a 1%), revelando que quanto mais a informação circula, mais diversas serão as reações. É um dado que apoia as afirmações contra a perspectiva do déficit, que concebe o público como uma caixa em branco, vulnerável a aceitar o conhecimento científico sem questionamentos.

Formação de clusters

Pela classificação hierárquica utilizando o SPSS (Ward’s Method/Squared Euclidean Distance), geramos os clusters considerando as variáveis preditoras, capazes de explicar os fenômenos: número de pessoas alcançadas, visualizações do vídeo, reações positivas e negativas, compartilhamentos, marcações, críticas, elogios e perguntas. Analisamos as possibilidades de dois a cinco clusters. Com base nas frequências de casos enquadrados em cada um, optamos por cinco clusters, por gerar grupos mais fragmentados, possibilitando análises mais detalhadas. Nas cinco opções, um dos clusters permaneceu sendo constituído por apenas um caso, que pode ser considerada outlier, porque repercutiu de forma muito diferente dos outros: teve alcance de mais de 500 mil usuários e foi recorde de interações.

Com cinco clusters, tivemos a oportunidade de analisar as diferenças entre dois grupos maiores (38 e 46 casos) e três menores (um, quatro e seis casos) (Tabela 2).

Tabela 2
Possibilidades de geração de clusters e classificação atribuída à opção de cinco clusters

Fonte: Elaboração dos autores, com base no processamento de dados extraído do software SPSS.

O que diferencia os clusters é o alcance e a interação. Diante disso, foram nomeados conforme especificado a seguir:

(i) Desempenho baixo: das 46 publicações que compõem esse cluster, 23 têm uma característica comum: tratam de temas de pesquisa de interesse muito específico de determinados públicos e áreas, tais como a cafeicultura, o cultivo da moringa, painéis de madeira, produção de MDP, raças de touro, redes complexas, corte de árvores, tratamento de resíduos oleosos, tecnologia da termografia infravermelha, judicialização de políticas públicas e Estudos de Einstein a Hawking.

Para as outras 23 pautas que integram essa situação de baixo desempenho, é possível levantar outras hipóteses sobre o que motivou a repercussão limitada. A princípio, são temas que deveriam ser capazes de mobilizar interesse geral, como informações sobre doenças, atropelamento de animais nas estradas, sono ao volante, games, música, dieta para cães, saúde mental e suicídio, entre outras. Defendemos que essas publicações devem ser analisadas caso a caso, porque as explicações para o desempenho podem ser diversas, incluindo fatores como data e horário da postagem, tipo de texto utilizado na chamada do post, atratividade dos 10 segundos iniciais dos vídeos, entre outras. A constatação de que a explicação não está necessariamente no tema do post é possível pela comparação entre duas postagens que tiveram o mesmo tema – a expedição urubu na Estrada, relativa ao atropelamento de animais. Uma postagem teve desempenho baixo e outra, desempenho razoável, com quase três vezes mais alcance. Um estudo qualitativo seria necessário para identificar as explicações.

(ii) Desempenho razoável: nesse cluster estão publicações referentes à educação de surdos, corrida de carrinhos de rolimã, conservação da cachaça, redução do sódio nos alimentos, pitaia, pescado, telhas com menores custos, resíduos de acerola, “expedição” urubu, cavalos manga-larga marchador, smartphone e alimentação, barragem de Mariana, barra de cereal light, empanado de pequi, aleitamento materno, linhaça e câncer, aves de fim de ano, cegos e educação, impactos dos resíduos de alumínio, micotoxinas afetando a saúde humana, entre outras. São temas que estão mais próximos do dia a dia das pessoas, interessando a um número mais amplo de cidadãos. Muitas pautas (a maioria) que envolvem alimentação estão neste grupo. Outras mexem com a curiosidade, como as constelações indígenas, o carro Caos, o drone de baixo custo e o carrinho de rolimã. Há também os temas que estão sempre na agenda midiática, como a questão das necessidades especiais (surdos e cegos), a questão ambiental (barragem de Mariana, clima na Amazônia, pecuária e meio ambiente, meteorologia, resíduos de alumínio), e temas ligados ao cuidado com a saúde e estéticos (óleos essenciais, micotoxinas, movimento antivacinas).

Poucos conteúdos (4) que tiveram interação razoável não se encaixam nos parâmetros mais comuns nesta categoria. Por exemplo, o post “Uepam é referência em pesquisas em Biomateriais” não traz termos próximos ao cotidiano, o texto da postagem não estimula a interação, não há nada de inusitado nas primeiras imagens do vídeo; ainda assim, ele se manteve neste cluster, com um envolvimento razoável. É possível que ele tenha alcançado bons números por uma mobilização da própria equipe de pesquisa, que pode ter se empenhado na interação. O mesmo pode ser dito do vídeo sobre o laboratório de microscopia eletrônica, sobre silagem e espiga de milho/nutrição do rebanho e sobre o Centro Brasileiros de Biologia Subterrânea.

(iii) Desempenho alto por interação: cluster composto por seis matérias que obtiveram desempenho bem acima do grupo razoável – alcances na média de 45 mil. Esse número ainda é bem menor do que o verificado no cluster de desempenho alto por alcance, mas, comparativamente, a interação aqui foi mais alta do que nesse último grupo (considerando compartilhamentos, elogios, perguntas, visualizações do vídeo, reações e marcações). Apesar de não serem temas com um potencial popular tão alto quanto o que será apresentado no cluster de interação recorde, algumas características das postagens podem ter contribuído para que fossem impulsionadas, ampliando os resultados positivos. Um dos posts é o da criação de um robô hexápode. Neste caso, podemos dizer que é um tema que desperta a curiosidade. Conjugada a isso, está a composição das imagens e do som, que dão ao vídeo um ar divertido, tanto que os comentários têm caráter diferente do cluster de interação recorde - expressam o quanto o vídeo é agradável: “fofo”, “gracinha”, “engraçadão”, “coisa mais linda”, “que amor”, “que bonitinho”, etc. O texto do post também é iniciado com uma pergunta, estimulando a participação do público.

A pitaia como fruta exótica é o tema de outro post de alto resultado. Ele foi publicado em janeiro e, logo na primeira linha do texto, apresenta a pitaia como a fruta do verão. Essa ligação com a estação do momento, em si, já pode potencializar o interesse do público. Os comentários revelam muito interesse das pessoas pelo cultivo: pedem mudas, perguntam sobre a forma de plantar, etc.

Estão neste grupo ainda, temas como: os benefícios do leite, mitos sobre a carne suína, esclarecimentos sobre vacinas e diferença entre os principais tipos de café. Nos dois últimos casos, o destaque pode ser atribuído à popularidade dos pesquisadores (percebida nos comentários). Ambos aparecem já na primeira imagem do vídeo. Já os casos da carne suína e do leite, além de estarem no grupo de alimentação, que mantém grande interesse entre o grande público, propõem-se a falar de “mitos”. É possível que esse tenha sido o atrativo discursivo para as publicações.

As seis matérias deste cluster têm características temáticas que as aproximam bastante do cluster de interação razoável, no qual encontramos outras pautas que despertam curiosidade. Porém, nas estatísticas elas aparecem em um grupo à parte, isso porque tiveram um engajamento significativamente diferente. Podemos supor que, além de trazerem curiosidades, a isso se somaram outros ingredientes que ajudaram a potencializar a divulgação: o caráter lúdico do vídeo no primeiro caso, com imagens agradáveis e cativantes; e, no caso do material sobre a pitaia, uma espécie de interesse do tipo “faça você mesmo”, plante, pratique. Isso, em parte, é sugerido pela chamada do vídeo, quando diz que é uma fonte de renda para a agricultura familiar.

Essas análises sugerem que temas de interação razoável, que provocam um envolvimento satisfatório, podem ter sua divulgação potencializada caso se utilizem estratégias de comunicação que os impulsionem: o ângulo da abordagem (no caso da pitaia), o caráter lúdico (no caso do robô), a recorrência ao termo “mitos” (carne suína e leite) e a popularidade dos pesquisadores que aparecem no vídeo (vacinas e café).

(iv) Desempenho alto por alcance: nesta categoria estão quatro postagens – desenvolvimento de um estetoscópio digital que facilita exames médicos, criação de um hidrogel que pode substituir tecidos moles do corpo, erros de orientações por nutricionistas no Instagram e o efeito emagrecedor do chá de hibisco. São temas de inovação (caso dos dois primeiros) e que envolve estética e qualidade de vida. A princípio, poderiam se encaixar entre as postagens de desempenho razoável, em função da proximidade temática com o dia a dia das pessoas. Os temas também se aproximam das publicações do cluster desempenho alto por interação, mas a diferença em relação a este último está nas interações. Apesar de ter alcançado número superior de pessoas, a interação por compartilhamentos, comentários e reações no cluster de desempenho alto por alcance teve uma média mais baixa. Isso contraria, em certa medida, os resultados das correlações, que mostram uma associação forte e positiva entre o alcance e essas interações. O resultado pode estar relacionado a algum tipo de priorização feita pelo algoritmo do Facebook em relação a temas nessa linha, impulsionando espontaneamente seu alcance. Entretanto, mesmo assim, a resposta em interação pelo público foi, proporcionalmente, de baixa mobilização. A explicação pode estar na ausência de quesitos de atratividade relatados no cluster anterior, ou mesmo no fato de que, apesar de os temas serem atrativos, os conteúdos das publicações os abordam de forma limitada.

(v) Desempenho recorde: este cluster é constituído unicamente pelo material sobre a diferença entre ovos caipiras e de granja. Trata-se de um tema muito próximo do interesse cotidiano, além de envolver uma controvérsia amplamente disseminada no Brasil. Entretanto, seu desempenho único pode ser atribuído tanto à força do tema como aos recursos de postagem: o texto começa com perguntas (Ovo caipira é mais nutritivo que o ovo de granja?), o que, segundo Hargittai, Füchslin e Schäfer (2018), estimula a interação. Há também uma dose de humor na frase “só não respondemos quem veio primeiro: o ovo ou a galinha...”. É um bom exemplo de postagem com amplo potencial de mobilização do público e de iniciativa promissora para a popularização da ciência. É o post com mais reações, críticas, perguntas e marcações, indicando o interesse público em perpetuar o diálogo. Entretanto, como já mencionado, foi um tema que mobilizou pouco o público jovem.

Sob o ponto de vista de priorizarmos uma PC dialógica, avaliamos que esse post chegou mais perto do objetivo, porque gerou interação participativa do público com a ciência. É evidente que a PC não pode optar por divulgar apenas conteúdos que se encaixem nessa perspectiva, porque seria empacotar as possibilidades e impedir o público de ter acesso à diversidade do conhecimento, mas os resultados indicam que esse tipo de pauta pode representar um bom início para romper barreiras de linguagem e produção, que separam ciência e sociedade.

Considerações finais

Adotamos neste trabalho a perspectiva de que a PC deve ocorrer pelo diálogo, ou seja, instituições geradoras de ciência e tecnologia, e seus cientistas, devem comunicar seus resultados à sociedade promovendo a interação horizontal e estimulando o público a participar das discussões. Tal perspectiva favorece o empoderamento do cidadão, para que se sinta motivado a ingressar em outros debates que, por sua vez, resultarão em decisões políticas de impacto para a vida social.

O artigo analisou a primeira fase dos trabalhos do Núcleo de Divulgação Científica da UFLA, em Minas Gerais, focando em uma mídia que viabiliza o diálogo – o Facebook. A avaliação quantitativa da interação do público permitiu reflexões sobre o potencial dialógico do projeto. Um estudo qualitativo futuro poderá complementar as análises, mas os dados quantitativos obtidos foram considerados reveladores, constituindo, inclusive, bons parâmetros para novos planejamentos do projeto e seu aperfeiçoamento.

Inserindo-se na lacuna de pesquisas identificadas por Hargittai, Füchslin e Schäfer (2018), este artigo preocupou-se com o potencial das mídias sociais para o compartilhamento de conteúdos relacionados à ciência.

As principais observações extraídas do processamento estatístico foram:

(i) O público reage aos conteúdos de ciência de forma diferenciada - o engajamento varia conforme o tipo de assunto abordado, as características do público (gênero e faixa etária) e as estratégias de comunicação utilizadas na postagem;

(ii) Mesmo nas publicações com maior envolvimento, a participação geral com críticas e perguntas é relativamente baixa. Esse ponto revela uma cultura ainda pouco afeita a discutir ciência, que corrobora a afirmação de Mejlgaard et al. (2012), de que a simples existência de possibilidades de participação não implica uma esfera pública altamente mobilizada em torno da ciência e tecnologia;

(iii) A participação de jovens de 13 a 17 anos é inexpressiva, em todas as análises, o que indica um público a ser estimulado;

(iv) As pessoas mais jovens nas faixas etárias de 18 a 24 e de 25 a 34 anos têm comportamentos muito específicos. Compõem o público mais frequente na recepção das postagens (até porque está aí a maior parte de estudantes de graduação e pós-graduação da instituição emissora), mas sua interação é limitada; um exemplo é o fato de compartilharem menos as postagens (correlação negativa entre esses públicos e os compartilhamentos). Outra característica dos grupos de 18-34 é a maior interação com temas de tecnologia e com os de áreas específicas de estudo, e o fato de ter tido uma participação mínima na matéria de maior repercussão geral;

(v) Faixas etárias acima de 55 anos são as menos alcançadas pelas postagens, mas são as que mais interagem: nelas, tendem a aumentar interações como críticas, perguntas e compartilhamentos. Entretanto, para chegar a esse tipo de público, é necessário aumentar o alcance das postagens. É um público que demonstra preferência por temas do cotidiano;

(vi) As matérias podem ser classificadas em cinco grupos, de acordo com a mobilização do público. Temas de aplicabilidade muito específica ficam no cluster de desempenho baixo; temas que exploram alimentação, curiosidades, questões ambientais, questões em voga na mídia, cuidados com a saúde e estéticos alcançam a desempenho razoável. O cluster de desempenho alto por Interação demonstra que um tema pertencente ao grupo de razoáveis, se explorado com recursos de comunicação mais estratégicos, têm o potencial de expandir muito seus resultados. Já no desempenho alto por alcance, estão temas que encontraram um impulso a mais, provavelmente por atenderem a critérios estipulados pelo próprio Facebook para estimular maior alcance;

(vii) A publicação que mais mobilizou o público - sobre a diferença entre ovos de granja e caipiras - foi a que mais se aproximou do modelo dialógico, porque provocou mais interações, incluindo perguntas e críticas. Suas características coincidem completamente com as apontadas por Pieczka e Escobar (2012) ao falarem das marcas da perspectiva dialógica da PC: a publicação aborda a ciência aplicada à vida cotidiana e deixa transparecer que ela é complexa e tem controvérsias. Trata-se de um post que, recorrendo a Santos (1988), podemos dizer que coloca a ciência em diálogo com o senso comum.

Os resultados nos permitem levantar uma hipótese, dependente de um método qualitativo para ser verificada: se usarmos as perspectivas teóricas da PC apresentadas por Pieczka e Escobar (2012), podemos dizer que nas ações do projeto ainda predomina a perspectiva do engajamento público - usando métodos mais criativos e interativos do que na perspectiva do déficit, mas ainda em uma comunicação hierárquica com o público, na qual não se verifica a continuidade de um diálogo, por meio de respostas da instituição aos comentários feitos nos posts, como apuraram Lee e Vandyke (2015) em seus estudos. As práticas avaliadas neste artigo, no entanto, pelos números da interação flertam com a perspectiva dialógica e têm potencial para alcançá-la. Uma análise de discurso crítica poderia apurar mais apropriadamente o tipo de relacionamento que as postagens estabelecem com o público.

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Notas

Financiamento Este estudo teve o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (APQ-04020-15).

Autor notes

Ana Eliza Ferreira Alvim da Silva Doutora em Administração pela Universidade Federal de Lavras (UFLA), mestre em Comunicação pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), especialista em Comunicação Empresarial e bacharel em Comunicação Social também pela UFJF. Como jornalista do quadro efetivo da UFLA, desenvolve atividades de comunicação organizacional, entre elas a produção de matérias jornalísticas institucionais e público-educativas. É membro da Rede Mineira de Comunicação Científica (RMCC) e coordena projetos de popularização da ciência na Universidade. Editora da revista de jornalismo científico Ciência em Prosa, na seção infantil. E-mail: anaeliza.alvim@ufla.br.
Gláucia da Silva Mendes Moraes Possui graduação em Comunicação Social pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2006), mestrado em Comunicação pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2009) e doutorado em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2015). Atualmente é jornalista da Universidade Federal de Lavras (UFLA). E-mail: glaucia.moraes@ufla.br.
Luiz Marcelo Antonialli É graduado em Agronomia pela antiga Escola Superior de Agricultura de Lavras - ESAL (1982), atual Universidade Federal de Lavras (UFLA). Mestre em Administração Rural pela ESAL (1988) e Doutor em Administração pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade-FEA/USP (2000). Professor Titular do Departamento de Administração e Economia da UFLA. Tem experiência nas áreas de Administração estratégica e metodologia quantitativa de pesquisa. E-mail: lmantonialli@ufla.br.
Editora responsável: Maria Ataide Malcher

Assistente editorial: Weverton Raiol

Declaração de interesses

Conflito de interesse Os autores declaram que não há conflito de interesse.


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