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Fidelidade e lealdade no rádio: uma visão de ouvintes catarinenses

Fidelidad y lealtad en la radio: una visión de los oyentes de Santa Catarina

Resumo

Esta pesquisa buscou entender os motivos que levam uma pessoa a privilegiar determinada emissora de rádio em meio às concorrentes e outros veículos de comunicação. Como objetivo geral, analisa os fatores que motivam um ouvinte a ser leal a uma determinada emissora de rádio. A presente investigação é exploratória e de caráter descritivo com uma abordagem qualitativa, sendo a amostragem por intencionalidade perante os critérios de seleção. Os dados foram coletados por meio de entrevistas em profundidade com ouvintes considerados leais pelas emissoras, por meio de roteiro semiestruturado com perguntas abertas. Como técnica de análise, foi utilizada a análise de conteúdo. Os fatores que motivam a lealdade do ouvinte de rádio da pesquisa foram: programação, locutor, vínculo, interatividade e hábito.

Palavras-chave:
Rádio; Audiência; Fidelidade; Lealdade; Valor de marca

Resumen

Esta investigación buscó comprender las razones que llevan a una persona a favorecer una determinada estación de radio entre los competidores y otros vehículos de comunicación. Como objetivo general, teníamos que analizar los factores que motivan a un oyente a ser fiel a una determinada emisora. La presente investigación es de carácter exploratorio y descriptivo con enfoque cualitativo, muestreo por intencionalidad según el criterio de análisis de este estudio. Los datos fueron recolectados a través de entrevistas en profundidad con oyentes considerados fieles por las emisoras, utilizando un guión semiestructurado con preguntas abiertas. Como técnica de análisis se utilizó el análisis de contenido. Los factores que motivan la fidelización del radioescucha en la investigación fueron: programación, locutor, vínculo, interactividad y hábito.

Palabras clave:
Radio; Audiencia; Fidelidad; Lealtad; Equidad de marca

Abstract

This research sought to understand the reasons that lead a person to privilege a given radio broadcaster among competitors and other media. As a general objective, we had to analyze the factors that motivate a listener to be loyal to a certain radio station. The present investigation is exploratory and of a descriptive nature with a qualitative approach, sampling by intentionality before the analysis criteria of this study. The data were collected through in-depth interviews with listeners considered loyal by the broadcasters through a semi-structured script with open questions. As an analysis technique, content analysis was used. The factors that motivated the loyalty of the research radio listener were programming, radio announcer, bond, interactivity, and habit.

Keywords:
Radio; Audience; Fidelity; Loyalty; Brand equity

Introdução

Mesmo em tempos de novas possibilidades midiáticas, o rádio tem estado presente na vida de milhões de pessoas, atingindo um grande público de variadas faixas etárias. Segundo dados do Grupo de Mídia de São Paulo (2023)GRUPO DE MÍDIA DE SÃO PAULO. Mídia Dados Brasil 2023. São Paulo: Grupo de Mídia de São Paulo, 2023. Disponível em: https://midiadados.gm.org.br/?category=radio. Acesso em: 27 out. 2023.
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, esse meio tem uma penetração de 55% da população total do Brasil e, em 13 regiões metropolitanas pesquisadas pela Kantar Ibope Media (2023)KANTAR IBOPE MEDIA. Inside Audio 2023. Brasil: Kantar IBOPE Media, 2023. Disponível em: https://kantaribopemedia.com/conteudo/estudo/inside-audio-2023. Acesso em: 27 set. 2023.
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, o rádio é ouvido por 80% dos habitantes com uma média, por ouvinte, de 3 horas e 55 minutos diários.

Com o desenvolvimento das tecnologias digitais, o rádio também vem se inovando e seguindo as tendências do mercado, se adaptando às mídias sociais e aumentando ainda mais o consumo pelos ouvintes. Para Lopez (2010)LOPEZ, D. C. Radiojornalismo hipermidiático: tendências e perspectivas do jornalismo de rádio all news brasileiro em um contexto de convergência tecnológica. Covilhã: LabCom, 2010. Disponível em: https://bit.ly/3o91zeA. Acesso em: 04 out. 2020.
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, o rádio não está sendo abandonado. Pelo contrário, está passando por uma metamorfose. Trata-se de um novo rádio com novas possibilidades e potencialidades, mas antes de tudo, continua sendo rádio. Assim, com o suporte oferecido pela tecnologia, os veículos vislumbram novas possibilidades para conquistar e fidelizar a audiência. Em sua tese de doutoramento, Leite (2017LEITE, R. C. Antecedentes da lealdade no setor da radiodifusão. Tese (Doutorado em gestão), ISEG, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2017. Disponível em: https://www.repository.utl.pt/handle/10400.5/13660. Acesso em: 17 ago. 2020.
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, p. 201), concluiu que “os ouvintes ficam mais ligados a uma estação se perceberem que a mesma tem algo de específico, seja no domínio da informação, seja no domínio do entretenimento”. Na visão de Prata (2002PRATA, N. A fidelidade do ouvinte de rádio. In: INTERCOM - Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, XXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Salvador, Bahia, 1 a 5 set. 2002. Disponível em: https://bit.ly/2HT1NHe. Acesso em: 17 ago. 2020.
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, p. 1), “cada veículo deseja e trabalha para ter seguidores que acompanham suas transmissões ou publicações de maneira fiel. O rádio também busca estes ouvintes, pessoas que sigam a mesma programação todos os dias, anos a fio”.

Diante desse cenário, questionamos: quais fatores levariam uma pessoa a ouvir continuamente a mesma emissora de rádio, ainda que diante de uma grande concorrência, em meio a tantas outras formas de consumo de mídia? Para responder à pergunta da presente investigação, definiu-se analisar os fatores que motivam um ouvinte a ser leal a uma determinada emissora de rádio.

Brand equity

A lealdade ou fidelidade, para alguns autores, é uma das principais categorias de ativos do brand equity, o denominado valor de marca. Segundo Kotler e Keller (2013KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013., p. 260) “é o valor agregado atribuído a bens e serviços”. Para eles, esse valor pode se expressar na forma como os clientes se sentem com a marca, assim como na participação no mercado, no preço e no lucro que a marca gera. Como conceitua Aaker (2007AAKER, D. A. Construindo Marcas Fortes. Porto Alegre: Bookman, 2007., p. 18), o brand equity “é um conjunto de ativos (e obrigações) inerentes a uma marca registrada e a um símbolo que é acrescentado ao (ou subtraído) do valor proporcionado por um produto ou de um serviço em benefício da empresa ou de seus clientes”. Segundo o autor, as principais categorias de ativos do termo são: consciência da marca, associações à marca e lealdade à marca (AAKER, 2012AAKER, D. A. Administração Estratégica de Mercado. 9. ed. E-book. Porto Alegre: Livroman, 2012.). Ele ressalta que a consciência da marca oferece uma percepção de familiaridade, auxiliando no fator de decisão de compra. Já a associação à marca é a percepção que o cliente tem em relação a ela, envolvendo seus benefícios. Por meio de determinados atributos, o cliente consegue vislumbrar o motivo de consumir determinado produto ou serviço, o que o eleva ao estágio da lealdade. Para o autor, a lealdade à marca viabiliza uma grande vantagem perante a concorrência pois, mesmo com os concorrentes melhorando seus produtos ou serviços, ainda é necessário fazer com que os clientes desistam da marca que já consomem.

Em relação à construção do valor de uma marca, Kotler e Keller (2013)KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013. explanam a Pirâmide de Ressonância (Figura 1), apresentando os valores em uma sequência de níveis.

Figura 1
Pirâmide da ressonância de marca

Segundo os autores, primeiramente se deve garantir a identificação de marca entre os clientes e sua associação em suas mentes. Na sequência, estabelecer o significado da marca, com fortes associações. Em terceiro, obter respostas adequadas sobre as sensações e julgamentos com relação à marca e, por último, adequar as respostas com o intuito de firmar um relacionamento de fidelidade ativo e intenso entre marca e cliente.

As ligações racional e emocional entre uma marca e seus consumidores também são o objeto de estudo do BrandZ, um estudo quantitativo realizado com consumidores desde 1998 pela empresa de consultoria Millward Brown, pertencente ao Grupo Kantar (VESELINOVA e SAMONIKOV, 2018VESELINOVA, E.; SAMONIKOV, M. G. Building brand equity and consumer trust through radical transparency practices. E-Book. Pensilvânia: IGI Global, 2018.). Segundo o modelo, a construção da marca envolve uma série de etapas, nas quais cada entrevistado é designado a um nível da pirâmide, dependendo de suas respostas a um conjunto de perguntas. Os resultados geram o que a empresa denomina pirâmide Brand Dynamics, à qual Kotler e Keller (2013)KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013. também se referem (Figura 2).

Figura 2
Pirâmide Brand Dynamics

De acordo com Kotler e Keller (2013)KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013., a Presença é a familiaridade baseada na experiência ou conhecimento da marca; a Relevância, as necessidades do cliente em relação a preço ou um conjunto considerado pelo cliente; o Desempenho, quando a marca/produto já é uma pré-seleção do cliente; a Vantagem, quando acredita-se que haja uma vantagem emocional ou racional sobre as outras marcas do mesmo segmento; e o Vínculo, quando a marca se destaca dentre as outras, possuindo ligações racionais e emocionais.

Fidelidade e Lealdade

Tavares (2008)TAVARES, M. C. Gestão de Marcas: construindo marcas de valor. São Paulo: Harbra, 2008. aponta que os profissionais de marketing utilizam os recursos psicológicos relacionados ao comportamento do consumidor para buscar entender os componentes utilizados na construção das marcas. O componente Cognitivo é relacionado ao conhecimento de marca; o componente Conativo relaciona-se com a frequência e custo de mudanças; e a Preferência da marca, obtida por um processo de avaliação entre produto real e ideal. Essa última característica também pode advir da familiaridade, identificação com o grupo e outros aspectos, como atributos emocionais ou racionais. Com a Preferência estabelecida, Tavares (2008)TAVARES, M. C. Gestão de Marcas: construindo marcas de valor. São Paulo: Harbra, 2008. sustenta que começa a surgir o afeto em relação a essa marca que despertou os sentimentos e as emoções do consumidor.

Solomon (2016)SOLOMON, M. R. O comportamento do consumidor: comprando, possuindo e sendo. 11. ed. Porto Alegre: Bookman, 2016. também estuda esses recursos psicológicos do consumidor dividindo-os em três categorias de tomada de decisão: Cognitiva, Habitual e Afetiva. Segundo o autor, uma decisão de compra cognitiva é resultado de uma série de estágios na escolha de um produto entre outras opções concorrentes. Ele descreve as demais categorias como a Habitual, relativa ao que nos permeia no ambiente para que nos faça tomar as decisões do cotidiano; e a Afetiva, relacionada ao nosso lado emocional e não ao processo que resulta na escolha racional. O autor traz o envolvimento com o produto como demonstração de lealdade, trazendo uma posição positiva à marca, não sendo a compra apenas por hábito. Em suma, além de demonstrar uma atitude positiva, geralmente o consumidor é apaixonado pelo produto.

Kotler e Keller (2013)KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013. relacionam a fidelidade a uma conexão forte e estreita com os clientes e citam três tipos de atividades utilizadas pelas empresas para aumentar a sua lealdade: a interação com eles, o desenvolvimento de programas de fidelidade e a criação de vínculos estruturais. Embora os termos fidelidade e lealdade pareçam similares, alguns autores afirmam que há diferença entre eles. Para Bogmann (2000)BOGMANN, I. M. Marketing de relacionamento: estratégias de fidelização e suas implicações financeiras. São Paulo: Nobel, 2000. e Giuliani (2006)GIULIANI, A. C. (Org.). Marketing contemporâneo: novas práticas de gestão com estudo de casos brasileiros. São Paulo: Saraiva, 2006., a fidelidade tem relação com a conveniência, isto é, os consumidores são fiéis por acreditarem que aquela é uma boa opção em determinado momento.

Já a lealdade envolve certa convicção e pressupõe uma relação mais aprofundada. Farias, Duschitz e Carvalho (2015)FARIAS, C.; DUSCHITZ, C.; CARVALHO, G. M. Marketing aplicado. 1. ed. Porto Alegre. Bookman/Tekne, 2015. também fazem essa diferenciação dos termos, sendo a fidelidade, para eles, a vontade de alguém continuar prestigiando a marca e podendo, vez ou outra, ir para a concorrência, porém acabar retornando, já que a marca geraria mais satisfação dentre as outras. A lealdade seria definida quando o cliente defende espontaneamente a marca, independentemente de a concorrência oferecer um preço ou uma oferta maior. Ele não a troca pois há valor agregado à marca. Segundo essas conceituações, percebe-se que a lealdade é um nível mais elevado do que a fidelidade pois, com a lealdade, o cliente é um defensor da marca e se envolve emocionalmente com ela.

Aaker (1998)AAKER, D. A. Marca: Brand Equity. Gerenciando o valor da marca. 10. ed. São Paulo: Negócio Editora, 1998. faz a classificação da lealdade em cinco níveis (Figura 3). No nível inferior, estão os clientes não-leais à marca, até o nível máximo, no qual estão os clientes que a defendem e, inclusive, a divulgam para outras pessoas.

Figura 3
A pirâmide da lealdade

O nível inferior se refere aos consumidores que são indiferentes à marca. Na sequência, estão os consumidores satisfeitos, incluindo os que compram habitualmente. Segundo Aaker (1998AAKER, D. A. Marca: Brand Equity. Gerenciando o valor da marca. 10. ed. São Paulo: Negócio Editora, 1998., p. 41), “eles podem ser denominados compradores habituais, um segmento que pode ser vulnerável aos concorrentes capazes de criar um benefício visível com a mudança - embora possa ser difícil convencê-los a mudar, por não estarem à procura de alternativas”. No terceiro nível estão os consumidores satisfeitos, mas que possuem resistência à mudança por medo de não se satisfazerem com a concorrência ou por já estarem envolvidos em algum sistema associado com outra marca como, por exemplo, um programa de fidelidade, mas são suscetíveis ao estímulo da concorrência (KOTLER e KELLER, 2013KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013.). No nível quatro existe um forte elo entre o produto ou serviço e os clientes que realmente gostam da marca e não pensam em mudar. E, por fim, no nível cinco, estão os consumidores que defendem a marca e a divulgam para outras pessoas. São os clientes 100% leais que, para Aaker (1998AAKER, D. A. Marca: Brand Equity. Gerenciando o valor da marca. 10. ed. São Paulo: Negócio Editora, 1998., p. 42), “têm orgulho de serem descobridores ou usuários da marca. A marca lhes é muito importante funcionalmente, ou como uma expressão do que eles são. A sua confiança é tal que recomendarão a marca para outras pessoas”. Esse consumidor é considerado o de maior relevância, pois ele passa adiante os valores da marca, colocando-a em outro patamar.

O rádio e suas novas possibilidades com o ouvinte

O rádio, em cenário de convergência, teve a necessidade de interagir com os novos meios para continuar agindo com força. Segundo Kischinhevsky (2016KISCHINHEVSKY, M. Rádio e Mídias Sociais. Mediações e interações radiofônicas em plataformas digitais de comunicação. Rio de Janeiro: Mauad X, 2016., p. 4), ele foi redesenhado, “foi forçado a se reinventar mais uma vez e, surpreendentemente, mostrou maior capacidade de reação do que outros meios de comunicação”. Para Lopez (2010LOPEZ, D. C. Radiojornalismo hipermidiático: tendências e perspectivas do jornalismo de rádio all news brasileiro em um contexto de convergência tecnológica. Covilhã: LabCom, 2010. Disponível em: https://bit.ly/3o91zeA. Acesso em: 04 out. 2020.
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, p. 115), o meio “não abandona suas características, não deixa de ser rádio, mas adequa suas rotinas e sua narrativa às possibilidades geradas pelos novos espaços de difusão de informação”. Kischinhevsky (2016)KISCHINHEVSKY, M. Rádio e Mídias Sociais. Mediações e interações radiofônicas em plataformas digitais de comunicação. Rio de Janeiro: Mauad X, 2016. utiliza o termo “rádio expandido” para caracterizar essa transição que vai além das ondas hertzianas e chega às mídias sociais, celulares, TV por assinatura, sites de jornais e aplicativos de música. A partir dessas novas possibilidades, Lopez (2010)LOPEZ, D. C. Radiojornalismo hipermidiático: tendências e perspectivas do jornalismo de rádio all news brasileiro em um contexto de convergência tecnológica. Covilhã: LabCom, 2010. Disponível em: https://bit.ly/3o91zeA. Acesso em: 04 out. 2020.
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relata que esse cenário dá a oportunidade de o ouvinte obter um serviço mais personalizado, em que ele escolhe o conteúdo e em qual horário o consumir como, por exemplo, por meio dos podcasts e outras ferramentas tecnológicas. O ouvinte, hoje, pode consumir o conteúdo de seu interesse em qualquer hora e lugar e quantas vezes sentir necessidade.

Com essa expansão em diversos meios, o rádio vem trazendo múltiplas formas de interação e conectividade com o ouvinte. Rosa (2017)ROSA, A. L. da. As mudanças na rádio com a chegada do aplicativo WhatsApp: Estudo de caso da rádio difusora de Laguna. Riuni Unisul Repositório Institucional, Tubarão, 2017. Disponível em: http://www.riuni.unisul.br/handle/12345/709. Acesso em: 25 set. 2020.
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defende que muito dessa interação se dá pela presença das mídias sociais nas emissoras. É essa interatividade que permite, por exemplo, que o público escolha as músicas a serem tocadas. No jornalismo, a participação dos ouvintes permite o debate e denúncias de problemas. As emissoras também costumam utilizar as páginas para realizar sorteios ou fazer transmissões ao vivo enquanto apresentam o programa.

O rádio, agora, exige um profissional que não utilize mais apenas a sua voz. É necessário um profissional multifacetado, quando “ser multimídia e multiplataforma passa a ser quase uma exigência para o profissional de comunicação. No rádio, é preciso começar a pensar a informação visual, começar a ler os acontecimentos sob uma perspectiva - técnica e tecnologicamente - mais ampla” (LOPEZ, 2010LOPEZ, D. C. Radiojornalismo hipermidiático: tendências e perspectivas do jornalismo de rádio all news brasileiro em um contexto de convergência tecnológica. Covilhã: LabCom, 2010. Disponível em: https://bit.ly/3o91zeA. Acesso em: 04 out. 2020.
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, p. 116). Galarça (2016)GALARÇA, S. L. Interatividade no rádio: o novo ouvinte exige um novo locutor. Revista Rádio-Leituras, v. 7, n. 1, p. 126-152, 2016. também traz o cuidado do comunicador em relação à imagem e à necessidade de se manter atualizado em relação aos fatos, às ferramentas, às pronúncias e a diferentes interpretações.

O papel do locutor é relevante, uma vez que faz a conexão entre meio e receptor. Na visão de Campos (2010CAMPOS, R. T. Jingle: Narrativa Sonora. In: FERRARETTO, Luiz Artur; KLOCKNER, Luciano (Orgs.). E o rádio? Novos horizontes midiáticos. Porto Alegre: Edipucrs, 2010, p. 372-388., p. 378), “o locutor é um corpo em meio ao aparato técnico. Esse corpo é quem faz a ligação entre o meio técnico e o ouvinte, pois o ouvinte não está apenas em busca de música, mas sim procurando por interação e companhia”. Além dessa relação com os locutores, há ativações de marcas que levam o ouvinte a participar de promoções que distribuem brindes ou permitem conhecer artistas, por exemplo. Segundo Campos (2010)CAMPOS, R. T. Jingle: Narrativa Sonora. In: FERRARETTO, Luiz Artur; KLOCKNER, Luciano (Orgs.). E o rádio? Novos horizontes midiáticos. Porto Alegre: Edipucrs, 2010, p. 372-388., essas participações trazem um sentimento de pertencimento ao ouvinte, aumentando o seu engajamento.

Kischinhevsky (2016)KISCHINHEVSKY, M. Rádio e Mídias Sociais. Mediações e interações radiofônicas em plataformas digitais de comunicação. Rio de Janeiro: Mauad X, 2016. realça a importância de fidelizar a audiência nesse novo cenário, uma vez que o ouvinte está mais suscetível a trocar de emissora devido à facilidade e à maior chance de migrar para outras plataformas. Segundo o autor, agora o ouvinte também pode interagir com outros, comentando a respeito da programação, fazendo elogios e críticas, sugerindo promoções e, claro, criando laços afetivos com a audiência.

Procedimentos metodológicos

Esta pesquisa é de caráter exploratório pois, segundo Gil (2008)GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008., busca obter familiaridade com o problema a fim de torná-lo mais claro. A população de estudo foi representada por ouvintes considerados assíduos na programação, sendo o contato intermediado por profissionais da área.

A amostragem é considerada não-probabilística, selecionada pelo critério de intencionalidade, em que “os indivíduos são selecionados com base em certas características tidas como relevantes pelos pesquisadores e participantes” (GIL, 2008GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008., p. 145). O método de coleta de dados foi constituído por entrevistas em profundidade através de um roteiro semiestruturado com perguntas abertas, utilizando-se dados primários e secundários, levando a uma abordagem do tipo qualitativa. Segundo Creswell (2010CRESWELL, J. W. Projeto de pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010., p. 206), esse tipo de abordagem baseia-se “em dados de texto e imagem, têm passos singulares na análise dos dados.” Considerando que temos como objetivo compreender os fatores determinantes da lealdade em emissoras de rádio, a pesquisa também é de caráter descritivo, pois para Gil (2008GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2008., p. 42) “têm como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno [...]”. A técnica de análise foi a Análise de Conteúdo (BARDIN, 1977BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.), mais precisamente uma descrição analítica envolvendo o tratamento do conteúdo das entrevistas.

Buscaram-se quatro emissoras de rádio dentre as 2521 1 Quantidade de emissoras obtidas através do site Radios.com. Disponível em: https://www.radios.com.br/radio/regiao/vale-do-itajai/117. Acesso em: 02 dez. 2020. da região do Vale do Itajaí, Santa Catarina, escolhidas pelo critério de relevância e proximidade, bem como a região do estado, por se tratar do mercado de atuação dos pesquisadores. Das emissoras pesquisadas, duas são do segmento jovem e duas do segmento popular. Ferraretto (2001FERRARETTO, L. A. Rádio: o veículo, a história e a técnica. Porto Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 2001., p. 54) define a segmentação dos tipos de emissoras

como um processo em que, a partir dos interesses dos ouvintes e dos objetivos da empresa de radiodifusão sonora, se adapta parte ou a totalidade de uma programação a um público específico. Considera-se, assim, não apenas classe social, faixa etária, sexo e nível de escolaridade, mas sim interesses determinados como, por exemplo, as preferências do grupo ao qual o indivíduo pertence.

Ferraretto (2014)FERRARETTO, L. A. Da segmentação à convergência: apontamentos a respeito do papel do comunicador de rádio. C&S - São Bernardo do Campo, v. 36, n. 1, p. 59-84, 2014. ainda conceitua os segmentos como a) jovem: público de até 25 anos, das classes A e B, de nível secundário ou universitário, tomando uma posição de amigo ou irmão mais velho ao orientar gostos e comportamentos e b) popular: voltado a ouvintes das classes C, D e E, com mais de 25 anos e escolaridade frequentemente inferior à conclusão do ensino fundamental. Sua programação é baseada na coloquialidade, com músicas de sucesso fácil, na prestação de serviços e na exploração do noticiário policial. De acordo com Prata et al. (2019)PRATA, N.; LOPEZ, D. C.; FREIRE, M.; AVELAR, K.; DIEHL, D. Posicionamento de rádios jovens brasileiras em redes sociais: compreendendo estratégias e ações de interatividade. Media & Jornalismo, v. 19, n. 34, p. 47-63, 2019. Disponível em: https://impactum-journals.uc.pt/mj/article/view/2183-5462_34_4. Acesso em: 27 out. 2023.
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o padrão do que se conhece hoje como segmento jovem de rádio teve início no Brasil nos anos 1970, com o crescimento do número de emissoras FM a partir da adoção do modelo americano: locutores com linguagem despojada, interação com a audiência, promoções, informalidade, brincadeiras e músicas de sucesso.

Para preservar a identidade das emissoras e dos ouvintes, foram atribuídas nomenclaturas como Emissoras 1 e 2 às rádios jovens e Emissoras 3 e 4 às rádios populares. A Emissora 1, localizada em Blumenau, foi fundada em 1981 e é afiliada de uma grande rede de comunicação. É a maior geradora de conteúdo jovem da região Sul, abrangendo 35 municípios. Já a Emissora 2, com sede em Itajaí, é afiliada de uma rede nacional de rádios. Foi fundada em 1986 e seu sinal abrange 36 municípios. A Emissora 3, com sede em Navegantes e com mais de 765 mil habitantes atingidos, alcança 14 municípios do estado. Finalmente, a Emissora 4 está localizada em Blumenau e é uma das 42 emissoras do grupo espalhadas pelo Brasil, cobrindo 73% do Estado de Santa Catarina. Seu sinal abrange 23 municípios e é líder de audiência em todas as faixas horárias.

Primeiro, buscou-se contato com as quatro emissoras de rádio, solicitando-se a relação de ouvintes que possuíam um ativo relacionamento com as emissoras. Após o consentimento desses ouvintes, as emissoras enviaram seus contatos aos pesquisadores, que em seguida, agendaram as entrevistas via aplicativo de mensagens com dois ouvintes de cada segmento. Os ouvintes foram identificados como Ouvintes 1 e 2 para a Emissora 1; 3 e 4 para a Emissora 2; 5 e 6 para a Emissora 3; e 7 e 8 para a Emissora 4. Para uma melhor compreensão, a Tabela 1 apresenta a identificação das emissoras e ouvintes:

Tabela 1
Identificação das emissoras e ouvintes

As entrevistas foram realizadas no período compreendido entre 14/10/2020 e 27/10/2020, por meio de chamada de vídeo via aplicativo de mensagens com a gravação do áudio para posterior transcrição. As entrevistas foram transcritas e documentadas em um diário de campo. Em seguida, os dados foram classificados e categorizados. Finalmente, as respostas foram descritas e apresentadas, identificando-se os fatores principais da lealdade dos ouvintes entrevistados.

Análise e discussão dos resultados

Para atender aos objetivos desta pesquisa, foram formuladas questões que se relacionassem ao brand equity, isto é, o valor de marca que utiliza atributos que venham a fomentar a lealdade dos ouvintes baseado nas teorias de Kotler e Keller (2013)KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013. e Aaker (1998AAKER, D. A. Marca: Brand Equity. Gerenciando o valor da marca. 10. ed. São Paulo: Negócio Editora, 1998., 2007AAKER, D. A. Construindo Marcas Fortes. Porto Alegre: Bookman, 2007., 2012AAKER, D. A. Administração Estratégica de Mercado. 9. ed. E-book. Porto Alegre: Livroman, 2012.). Os ouvintes também foram questionados sobre situações para averiguar o nível de fidelidade/lealdade perante a sua emissora favorita.

Foram realizados, ainda, questionamentos com base em pesquisas anteriores de antecedentes da lealdade do meio rádio e perguntas relacionadas à programação e outras características do meio. Os ouvintes foram questionados sobre a periodicidade com que ouvem a emissora, desempenho, imagem da marca e avaliações pessoais dos ouvintes, fatores emocionais em relação à emissora e o vínculo psicológico entre ouvinte e emissora, que avalia o nível de atividade gerado por essa fidelidade, segundo Kotler e Keller (2013)KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013.. Na Tabela 2, são apresentados os extratos das entrevistas e as categorias geradas a partir das falas dos ouvintes.

Tabela 2
Resumo de questões, extratos das entrevistas e categorização

Identificou-se que uma das ouvintes, mesmo com problemas de recepção do sinal, insiste em ouvir a emissora. Esse fator, no degrau do desempenho da pirâmide Brand Dynamics, é uma pré-seleção do cliente. Constatou-se que os ouvintes consideram importante a imagem que a emissora transmite e, inclusive, alguns identificam o locutor como a imagem da emissora. A imagem percebida pelo consumidor é um fator relevante do brand equity pois, segundo Kotler e Keller (2013)KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013., busca atender às necessidades psicológicas e sociais do cliente.

Aaker (2012)AAKER, D. A. Administração Estratégica de Mercado. 9. ed. E-book. Porto Alegre: Livroman, 2012. e Farias, Duschitz e Carvalho (2015)FARIAS, C.; DUSCHITZ, C.; CARVALHO, G. M. Marketing aplicado. 1. ed. Porto Alegre. Bookman/Tekne, 2015., em relação à lealdade com a marca, afirmam que um relacionamento estabelecido é mais trabalhoso para a concorrência tentar conquistar a clientela devido a todos os atributos considerados importantes e de valor na mente do consumidor. Kotler e Keller (2013)KOTLER, P.; KELLER, K. L. Administração de Marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2013. também se referem à lealdade como uma conexão forte, assim como Solomon (2016)SOLOMON, M. R. O comportamento do consumidor: comprando, possuindo e sendo. 11. ed. Porto Alegre: Bookman, 2016., que define o comportamento do consumidor como algo afetivo, relacionado ao lado emocional. Isso está presente nas falas dos ouvintes, ao justificarem porque não trocariam a emissora, defendendo os locutores, trazendo todo o relacionamento envolvido entre as partes, como mostram as transcrições da Tabela 2.

Para analisar o último nível da pirâmide da lealdade de Aaker (1998)AAKER, D. A. Marca: Brand Equity. Gerenciando o valor da marca. 10. ed. São Paulo: Negócio Editora, 1998., em que os consumidores são 100% leais a uma marca e a defendem tanto quanto têm orgulho e se sentem confortáveis ao disseminá-la, foram realizados dois questionamentos: o primeiro, se alguém já proferiu comentários desfavoráveis a respeito da emissora para o ouvinte. Segundo a maioria dos entrevistados, esse fato nunca havia ocorrido, muito pelo contrário. As pessoas ao seu redor prestigiam a emissora. Destaca-se o trecho da Ouvinte 8: “Não. Desde que eu ouço a rádio, nunca. Mas também não ia deixar, né? Porque eu ouço a rádio e gosto, né?”. Observa-se, então, a ouvinte agindo como defensora da marca, o que nos remete a Aaker (1998)AAKER, D. A. Marca: Brand Equity. Gerenciando o valor da marca. 10. ed. São Paulo: Negócio Editora, 1998., quando relaciona a lealdade como o último nível da pirâmide. A segunda questão indagou se o ouvinte já havia indicado a emissora para alguém e dois entrevistados relataram de forma afirmativa. Segundo o autor, essa é uma questão de confiança, na qual o consumidor considera a marca muito importante e orgulha-se dela. A seguir, são descritas as categorias predominantes dos extratos das entrevistas em relação aos fatores que fundamentam a lealdade às emissoras pesquisadas.

Programação

Foi percebido que os ouvintes das emissoras jovens prezam pelo estilo musical. Notou-se que muitos programas, segundo os entrevistados, são únicos em relação ao estilo musical e que, segundo eles, não há o que se compare e que somente ali irão encontrar o que estão buscando. Os ouvintes também prezam pelos programas locais em detrimento dos transmitidos nacionalmente.

A Ouvinte 7, ao ser questionada sobre o que a faria desistir da emissora, respondeu que um fator seria a programação, caso não tivesse uma boa seleção musical ou se as músicas fossem executadas de forma repetitiva. Um fator que chamou a atenção foi o programa preferido de cada ouvinte, quando os dois entrevistados de cada emissora escolheram os mesmos programas, representados por produções presentes há muito tempo na grade. Segundo Prata (2002PRATA, N. A fidelidade do ouvinte de rádio. In: INTERCOM - Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, XXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, Salvador, Bahia, 1 a 5 set. 2002. Disponível em: https://bit.ly/2HT1NHe. Acesso em: 17 ago. 2020.
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, p. 5-6), “programas com longo tempo no ar tendem a criar fidelidade no público que ouve a emissora. As pessoas se acostumam com o horário, com o formato, com o comunicador, com as atrações e sabem que podem contar com aquele programa do jeito a que estão acostumadas, sem grandes mudanças”. Alguns ouvintes relataram ter tentado mudar de emissora como forma de teste, mas, devido à programação não ser atrativa, voltaram a ouvir a anterior.

Locutor

O locutor foi um dos fatores que mais se destacaram na geração dessa lealdade entre emissora e ouvinte. Para Campos (2010)CAMPOS, R. T. Jingle: Narrativa Sonora. In: FERRARETTO, Luiz Artur; KLOCKNER, Luciano (Orgs.). E o rádio? Novos horizontes midiáticos. Porto Alegre: Edipucrs, 2010, p. 372-388., o locutor faz essa conexão entre o meio e o cliente e, por muitas vezes, se torna a imagem ambulante da emissora, circulando pelas ruas, dando atenção ao público em eventos. Também nas promoções das emissoras, foi percebido que os ouvintes levam em conta de forma pessoal a questão do sorteio de brindes: “Eu já ganhei um monte coisa da [locutora] já, só ela que me dá coisa [...]” (Ouvinte 6). Também foi percebido que muitos ouvintes substituem o nome do programa pelo nome do locutor.

Ao serem questionados sobre motivos que os fariam deixar de ouvir sua rádio favorita, metade dos entrevistados responderam que, se o locutor deixasse a emissora, não seria mais a mesma coisa. O locutor também se mostra importante no diferencial da marca. Ao perguntar sobre o diferencial da emissora favorita do ouvinte com relação às demais, a figura do locutor foi destaque. Ao serem questionados a sobre o que consideram uma forma de relacionamento com a emissora, o locutor predominantemente aparece, o que tem relação com o afeto. Esse é um fator que se reflete em atitudes de lealdade, segundo Tavares (2008)TAVARES, M. C. Gestão de Marcas: construindo marcas de valor. São Paulo: Harbra, 2008.. Além disso, foi destacada nas entrevistas a atenção que os ouvintes possuem com os locutores, como por exemplo: “O [locutor] também quando faz aquele [programa da emissora] com a [locutora] que eu me divirto muito com os dois. O [locutor] que tá substituindo ela, ela e o [locutor] fazem videozinho muito massa.” (Ouvinte 7). Na visão de Campos (2010)CAMPOS, R. T. Jingle: Narrativa Sonora. In: FERRARETTO, Luiz Artur; KLOCKNER, Luciano (Orgs.). E o rádio? Novos horizontes midiáticos. Porto Alegre: Edipucrs, 2010, p. 372-388., o ouvinte não está ali só ouvindo música, notícia, o ouvinte está em busca de companhia também.

Vínculo

O vínculo, um dos fatores que fazem a ligação emocional e racional entre cliente e marca utilizado no nível do modelo Brand Dynamics, se destacou nas respostas dos ouvintes. Um exemplo é a Ouvinte 8 que, ao ser questionada se sente falta quando não envia mensagens para a emissora, respondeu: “Sim. [...] Querendo ou não, se torna um membro da família né? Porque é todo dia comigo ali, eu fico o dia inteiro ali em casa sozinha, o marido trabalha fora, aí eu sempre converso com eles, mando mensagem.” O rádio, então, acaba por ser uma companhia para o ouvinte, quando este se relaciona com os locutores.

Uma situação semelhante ocorre com a Ouvinte 1, que afirma que realmente gosta da emissora devido ao vínculo com os locutores, chegando a visitá-los na emissora. Essa conexão ilustra uma via de mão dupla: “Eu acho que é uma coisa assim tanto eles com a gente e a gente com eles, é uma forma de ajudar, né? A rádio ajuda a gente distraindo e a gente ajuda eles com a audiência, né? Que é o que tem que ter pra rádio ter sucesso, né?” (Ouvinte 7).

O vínculo está muito presente nessa interatividade, no relacionamento do ouvinte com o locutor e com a emissora. “Eles mandam uma coisinha agradecendo alguma coisa, às vezes até eles não ouvindo o nosso áudio no rádio, assim mesmo a gente ganha prêmio, e isso significa que eles ouviram, né?” (Ouvinte 8). Percebeu-se que pequenas atitudes acabam construindo um grande alicerce de valor entre marca e consumidor.

Interatividade

A interatividade entre ouvinte e locutor foi um dos fatores que ganharam destaque na questão da lealdade, quando o ouvinte participa dos programas, dá sua opinião, pede música, sugere música para a programação, envia notícias auxiliando o jornalismo da emissora, além de todas as promoções que permitem ao ouvinte interagir com o conteúdo digital.

Ressalta-se o sucesso de um programa da Emissora 1, sendo o preferido dos dois ouvintes pesquisados. Nele, os ouvintes pedem música, mandam mensagens e interagem. Segundo o Ouvinte 1, há tanta conexão que os ouvintes acabam chegando a um consenso entre o estilo musical tocado durante o horário. Ainda, o rádio proporciona aos ouvintes a oportunidade de pedirem suas músicas favoritas, mandar recado para a família, amigos, participarem de enquetes, depoimentos, além de todo o reconhecimento que o locutor transmite, trazendo os ouvintes para próximos de si, como se fossem amigos há décadas. Destacaram-se, nessas entrevistas, depoimentos que refletem essa relação de interatividade: “a gente tem muita interatividade com ela [...], eu gosto muito, no Youtube eu faço comentários pra ela, [...] ela é muito querida, ela dá uma atenção pro público assim que, é bem gente boa.” (Ouvinte 3). Ou ainda: “[...] é muito legal, passar o nome ao vivo, a voz da gente ao vivo, é bem legal” (Ouvinte 5).

Os sorteios também são de grande significância para essa interatividade. Muitos ouvintes enviam mensagens para as emissoras incluindo imagens e áudios por aplicativos, compartilhando postagens nas mídias sociais. Toda essa interatividade traz ao ouvinte, segundo Tavares (2008)TAVARES, M. C. Gestão de Marcas: construindo marcas de valor. São Paulo: Harbra, 2008., a sensação de pertencimento, de ser visto, lembrado por alguém, além do prazer de as pessoas ouvirem seu nome na emissora, aumentando assim a preferência, as atitudes perante a emissora e o afeto, fatores que influenciam e determinam a escolha do consumidor.

Hábito

O hábito de ouvir rádio com os pais na infância ou ser influenciado por alguém também levou os entrevistados a darem continuidade a essa prática. O hábito se encontra no segundo recipiente do comportamento do consumidor de Solomon (2016)SOLOMON, M. R. O comportamento do consumidor: comprando, possuindo e sendo. 11. ed. Porto Alegre: Bookman, 2016., quando se age de forma inconsciente e, depois, avança para o terceiro recipiente: o emocional. Percebeu-se primeiramente, no discurso dos ouvintes, uma escolha racional e, posteriormente, uma evolução do seu relacionamento até chegar à lealdade. Podemos observar essa evolução pelo depoimento a seguir: “Eu comecei do nada, liguei o som aqui, botei em 2016, aí conheci a [locutora] que ela tinha acabado de entrar lá, aí liguei no rádio e não parei mais, é dia e noite, sem parar” (Ouvinte 6). Essa ouvinte em especial, primeiramente, optou por uma escolha racional ligada à qualidade do sinal da emissora, porém evoluiu para ressonância ao criar esse vínculo afetivo com a emissora.

Considerações finais

De acordo com o objetivo proposto de identificar os fatores que levam um ouvinte a sempre estar sintonizado a uma mesma emissora, mesmo com tanta concorrência e meios de comunicação, foram evidenciados aspectos relevantes que motivam um ouvinte a permanecer assiduamente na programação de sua rádio preferida. Assim, chegou-se às condições predominantes de lealdade às emissoras objetos desse estudo: programação, locutor, vínculo, interatividade e hábito.

É interessante ressaltar, ao analisarmos os resultados, que se trata de um conjunto de fatores, e não um fator isolado. Notou-se que, nas emissoras jovens da pesquisa, predomina a questão da programação, fator não determinante na falta de um locutor engajado com os ouvintes, que não prestigie suas sugestões musicais e que não coloque no ar suas participações. Descobriu-se que os ouvintes consideram e fazem mais uso do rádio tradicional do que em outras plataformas, exceto em momentos com problemas na recepção do sinal. Também existe o hábito de consumo oriundo de sua família, normalmente da infância.

Como sugestão para trabalhos futuros, recomendam-se investigações a respeito de cada atributo do valor de marca buscando, de forma mais desenvolvida, a compreensão deste consumidor ouvinte de rádio, o qual demonstra tanto potencial de engajamento. A fidelidade e a lealdade no universo radiofônico são temas ainda passíveis de serem explorados como fenômeno de resistência, revelando a profunda conexão que os ouvintes estabelecem com suas estações de rádio preferidas, transcendendo as barreiras do tempo e da tecnologia.

Disponibilidade de dados

Os autores declaram que os dados que suportam a pesquisa estão disponíveis por meio de solicitação aos autores.

  • Editora responsável: Maria Ataide Malcher
  • Assistente editorial: Aluzimara Nogueira Diniz, Julia Quemel Matta, Suelen Miyuki A. Guedes e Weverton Raiol.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    20 Out 2022
  • Aceito
    26 Out 2023
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